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Classificação na dor crônica – Mudanças a caminho

Ação Internacional de Doenças (CID) prevê avanços no campo da dor, ao término de 2021. Debates sobre a CID-11, em vigor desde 1º de janeiro de 2022, tratavam da inclusão de condições dolorosas crônicas, primárias e secundárias. Em entrevista publicada no ABNews,  Rogério Adas Ayres de Oliveira, coordenador do DC de Dor da ABN, discorreu sobre a revisão realizada para a CID-11 por especialistas em dor sob liderança da International Association for the Study of Pain (IASP) em parceria com membros da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Quais tipos de síndrome dolorosa foram incluídos nesse grupo e qual a vantagem de classificá-los como tal?

A dor crônica afeta cerca de 30% da população mundial, constitui um dos principais fatores de morbidade, e é a condição que lidera o ranking de anos vividos com incapacidade globalmente (Global Burden of Disease Study, 2016). Ainda assim, a CID-10, classificação vigente atualmente, não contempla as principais síndromes dolorosas. A dor neuropática, por exemplo, com prevalência aproximada de 7% da população, não tem classificação própria na atual CID. Com o intuito de corrigir tais distorções, uma força-tarefa composta por especialistas em dor de todo o mundo, liderados por um comitê da IASP, em contato com membros da OMS, promoveu uma revisão abrangente da classificação das dores crônicas para a CID-11.

A partir de sua vigência, programada para o início de 2022, a CID-11 deverá incorporar as principais síndromes dolorosas primárias e secundárias, dentro de estrutura hierarquizada e com “múltiplo parentesco”. Permitirá que a dor crônica possa ser classificada em todas as suas principais variantes, conjuntamente com as demais condições já classificadas, em um formato objetivo e flexível. A CID-11 constitui um grande avanço, e deverá aprimorar as pesquisas e a assistência em dor. Ainda, poderá facilitar a implementação de políticas de saúde direcionadas à questão da dor crônica nos sistemas de saúde e quiçá facilitar o financiamento de programas de saúde voltados a esse cenário, tão carente de estrutura nos sistemas de saúde público (Sistema Único de Saúde – SUS) e suplementar e no mundo privado. As principais condições dolorosas crônicas, até agora “órfãs”, foram classificadas. Esperamos que a melhora do reconhecimento, do rastreio e da categorização das condições dolorosas crônicas possa trazer uma oportuna luz na tipificação dos diferentes cenários de dor crônica, comumente obscuros mesmo para neurologistas, outros especialistas e generalistas. A figura ao lado representa a dor crônicana CID-11. A classificação distingue as condições de dor crônica primária e síndromes de etiologia conhecida ou fisiopatologia estabelecida associadas à dor crônica (secundária).

Quais foram os critérios utilizados para classificar uma dor crônica como primária, como a síndrome complexa de dor regional (SCDR)?

Dor crônica primária é definida como aquela que persiste ou recorre por um período superior a três meses, associada a estresse emocional ou incapacidade funcional para a vida cotidiana e que não pode ser atribuída a fator causal que justifique sua ocorrência. Essa classificação permite situar as condições dolorosas primárias como entidades próprias e que podem ocorrer independentemente ou de forma associada a outras doenças. No caso da SCDR, por exemplo, é um quadro motivado por evento nocivo desencadeante ou imobilismo, com dor contínua, alodínea ou hiperalgesia desproporcionais ao evento gerador, edema e alterações vasomotoras ou tróficas (SCDR tipo I). Na presença de lesão nervosa (SCDR tipo II), a condição poderá ser classificada também dentro do campo das dores neuropáticas crônicas, secundárias.

Seria possível descrever como ficaram os grupos de dor crônica primária e nos dar alguns exemplos de síndromes incluídas nesses capítulos?

As dores crônicas primárias serão classificadas na CID-11 nos seguintes grupos: dor crônica generalizada (sindrome fibromiálgica), SCDR, cefaleia ou dor orofacial crônica primária, dor visceral crônica primária e dor mus culoesquelética crônica primária. No caso das cefaleias crônicas primárias, a classificação permitirá “múltiplos pais”, ou seja, condições primárias como a cefaleia tipo tensão crônica ou migrânea crônica, já classificadas na atual CID-10, poderão ser classificadas simultaneamente na CID-11.

A versão final da CID-11 listará as condições mais comuns de dor neuropática persistente ou recorrente.

A classificação fornecerá critérios de diagnóstico para dor neuropática possível (isto é, história de lesão ou doença do sistema nervoso e distribuição neuroanatomicamente plausível da dor), provável (isto é, sinais somatossensitivos na mesma distribuição) e definitiva (isto é, testes confirmatórios, como demonstrado para dor neuropática central crônica associada a lesão medular).

Existem algumas síndromes dolorosas que podem se sobrepor, como a polineuropatia induzida por quimioterápicos, que pode ser incluída tanto no grupo dor relacionada ao câncer como no grupo dor neuropática. Como devemos classificá-la?

Sim, muitas condições dolorosas se sobrepõem. A CID-11 resolve o problema

de entidades que pertencem a diferentes campos por permitir “múltiplos parentescos”. No caso da polineuropatia dolorosa causada por quimioterapia, é classificada como dor crônica neuropática e dor crônica relacionada ao câncer. Dor crônica é o “código mãe” de sete códigos correspondentes às principais condições dolorosas crônicas: dor crônica primária; dor crônica relacionada ao câncer; dor crônica pós-traumática ou pós-cirúrgica; dor crônica neuropática; dor crônica relacionada a cefaleia ou dor orofacial secundária; dor crônica visceral secundária; e dor crônica musculoesquelética secundária. A classificação por múltiplos parentescos permite que um diagnóstico “filho” acesse mais de um parentesco superior, preservando sua identidade sob dois códigos parentais, o que permitirá maior flexibilidade em relação à CID-10. Deverá facilitar o entendimento e melhor pautar os diagnósticos de condições dolorosas complexas, além de facilitar a comunicação entre médicos generalistas, especialistas, demais profissionais de saúde e gestores.

A gravidade da síndrome dolorosa e seu grau de impacto na qualidade de vida do paciente foram contemplados na atual classificação?

Esse é outro importante diferencial da CID-11 em relação às versões anteriores. Propõe um “código de extensão”, que classifica a gravidade, as características temporais e os fatores psicossociais associados à dor e permite classificar a magnitude do impacto funcional da dor em determinado indivíduo.

REFERÊNCIA

Treede R-D, Rief W, Barke A, et al. Chronic pain as a symptom or a disease: the

IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases

(ICD-11). Pain. 2019 Jan;160(1):19-27. do: 10.1097/i.pain.0000000000001384

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